O Assento
Hoje me aconteceram duas coisas inéditas e interessantes. O curioso mesmo é a relação entre uma e outra – o como elas se conectam e se complementam.
A primeira delas é que, pela primeira vez, me ofereceram um lugar no ônibus. Como isso nunca havia me acontecido, eu olhei para a moça confuso, sem entender muito bem o motivo da gentileza no início. A encarei curioso por um momento, depois mirei para o assento vazio e tudo me veio à memória.
Minhas brincadeiras no barranco da fazenda da família com meus muitos primos. Enquanto ainda éramos unidos, costumávamos escorregar pela lama em dia de chuva num barranco que dava para um lago raso, cheio de girinos pretos na margem. A comida simples, mas perfeita, de minha querida mãe. O suor mal humorado de meu pai no fim do dia. Meu tempo turbulento de colégio – com muitas brigas, notas baixas e diplomas sofridos. Minhas namoradinhas, depois minhas mulheres. O tempo que gastei trabalhando e a quantidade de estresse e vida que desperdicei. Minhas três estrelinhas do céu: Doroty, Frajola e a orelhuda Pituchinha… que saudades dela! O nascimento dos meus filhos, seu crescimento, a morte da minha esposa. Os aniversários. Os Casamentos. Os risos. Os Choros. Toda minha vida…
Brigando com os joelhos e com a coluna eu me sentei sorridente depois de agradecer à moça. Era estranho, mas no fundo eu sabia que aquele lugar era meu e esperava por mim já há alguns anos…
Ah! Quase me esqueci de contar a segunda coisa: meu primeiro neto nasceu hoje à tarde. E ele é a minha imortalidade, é o renascimento de minha querida Francisca, é o milagre do meu filho. Meu neto, seus olhos, seus pesinhos rosas. Este é o prêmio das rugas e cicatrizes de minhas mãos. E eu não poderia querer nada mais…
Escrito por Konno