Ana e os Anjos

Era noite de Outono e o Inverno parecia estar impaciente para tomar seu lugar, pois estava muito frio.

Devido à morte de seus pais, Ana era criada por sua avó, Aurora, na fazenda da família. Naquela noite, a menina permanecia coberta no sofá e a sua avó preferira a cadeira de balanço, ambas em frente à lareira acesa. Vovô Bernardo estava na cozinha preparando chocolates quentes para todos.

Ana tinha apenas seis anos, mas já era esperta como a mãe fora um dia. Sentia falta dos pais e vivia pensando onde eles estariam, se havia algo além da vida. Distraída e curiosa sobre um tema que ouvira na escola, ela olhou para sua avó, que balançava a cadeira devagar, e perguntou subitamente:

– Vovó?

– Sim, querida.

– Anjos existem?

Aurora sorriu e virou a cabeça num gesto de carinho; sabia muito bem de onde vinha aquela dúvida.

– Existem sim, meu amor.

– E como eles são?

– Ah… eles são muitos e de infinitas aparências. Quer que eu te conte como são os anjos?

A menina assentiu com a cabeça, entusiasmada.

– Bom, deixe-me pensar um pouco, minha menina. Anjos… bom, os anjos são variados. Eles podem ser pequeninos ou grandalhões. Podem ser lindinhos ou feiosos. Existem anjos que te protegem, mas existem também anjos que fazem mal e devemos tomar cuidado com esses…

– Por que eles fazem mal, vovó?

– Ah… isso é da natureza deles, meu amor. Eles nem sabem que estão errados. Mas nós também podemos fazer mal aos anjos! Há pessoas ruins que maltratam anjos e nem sabem o quão eles são sagrados.

– E porque os anjos não fazem nada?

– Ah, minha menina, muitos não têm escolha. Talvez por medo, talvez por amor…

A menina ficou em silêncio, pensativa. Aurora continuou:

– Existem anjos que chegam na sua vida para te ajudar num momento ruim. Talvez dar um novo sentido, um novo conforto. Se você aceitar esses anjos, Ana, talvez eles te acompanhem por muitos anos…

– E eles têm asas?

– Ah, sim! Muitos têm asas! Mas não são todos, nem todos os anjos precisam de asas. Eles precisam apenas de olhos…

Olhos, vovó?

– Sim, querida. – Aurora levantou-se e entregou Bingo, o velho gato da família, para Ana. – Todo o amor que os anjos têm para oferecer e toda a retribuição que nós podemos dar se dão pelos olhos.

A menina pegou o animal e olhou nos olhos dele. Bingo era carinhoso e geralmente tinha a expressão doce e tranquila. Balançava o rabo e ronronava sempre que ficava perto de Ana. A menina finalmente entendeu e sorriu animada para a sua avó.

– Os animais, vovó! Os animais são os anjos!

Aurora sorriu e beijou a neta, o presente que sua filha lhe dera antes de partir apressada para um lugar melhor.

– Sim, meu amor. Devemos cuidar dos anjos que Deus nos deu, pois eles são o amor divino em carne e osso.

Ana apertou Bingo contra si, mas devagar apenas como um gesto de carinho.

– Mas não só eles, devo acrescentar, há outros tipos de anjos em nossa vida e eles nem sabem que são anjos…

Bernardo voltou sorridente perguntando quem por acaso queria o melhor chocolate quente do mundo. Ana gritou animada e levantou sua mão. Aurora olhou para o seu antigo marido e depois novamente para a neta. Soube, então, que passaria bem pela noite fria mais uma vez.

Escrito por Cristiano Konno


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